Todos temos heróis. A vida seria muito triste sem eles.
Como é comum, meu herói não escolheu ser quem é. Não escolheu ter superpoderes. Seus caminhos foram escritos por outras pessoas enquanto ele ainda era uma criança. Sua jornada o transformou em alguém que ele não imaginava que pudesse ser.
A saga de um herói pode começar com ele sendo forçado a abandonar a sua terra, o seu lar. Neste caso, foi assim.
O pequeno herói crescia, sem saber ao certo o que fazer. Sem saber exatamente qual era o seu poder e como deveria proceder.
Mas ele continuava crescendo, e num novo mundo em que era comum ver uma criança abandonada, o herói resolveu trabalhar. Ele não queria estar nesta terra, não queria permanecer aqui, então montou um plano. Resolveu que se trabalhasse muito, talvez conseguisse voltar. Ele poderia usar todo o seu conhecimento. Aos 5 anos, começou a construir sua vida, começou a construir o seu retorno.
Ele cresceu e com a maturidade, veio a realidade… Agora tinha laços com a nova terra. Talvez nunca voltasse para casa. Ele queria voltar, mas não sabia se era seguro para aqueles que passou a amar.
Durante anos, ele passou o tempo olhando para trás com o terrível “e se…” se formando em sua mente. A saudade do cheiro, dos ideais, das pessoas e de sua vida antiga apertava o seu pequeno coração.
Guardava esse sentimento com ele. Ninguém percebia, ninguém tinha ideia, poucos entenderiam se soubessem. Nas poucas vezes que tocou no assunto, não foi compreendido. Tanto amor por uma terra que não via há anos não parecia normal aos olhos dos outros.
A primeira vez que salvou alguém foi sem a intenção exata de o fazer. Ele apenas fez o que deveria ter feito, sem se dar conta disso. Até que se tornou rotina. Quando menos esperava, salvava alguém.
Foi aí que ele se jogou em salvação. Talvez, apenas talvez, se ele usasse o seu tempo para salvar outras pessoas, se ele usasse o seu tempo para criar um mundo melhor para outras pessoas, se ele usasse o seu tempo para qualquer coisa que não fosse ele, poderia se sentir satisfeito.
Dura e tristemente, o herói percebeu que não era esse o caminho. Ao se doar tanto, ele se perdeu e, ao se perder, não sabia mais como retornar.
Ele construiu e melhorou um mundo para os outros e se viu mais perdido do que no dia em que, ainda garotinho, foi obrigado a vir para o Novo Mundo.
E foi assim que eu o encontrei. A pessoa que me salvou um dia agora precisava de salvação.
Não foi fácil explicar a ele que salvar os outros é uma coisa linda, mas não se pode viver apenas disso. Não foi fácil explicar a ele que agora ele era um herói adulto, não precisava mais da aprovação de ninguém e já poderia voltar para casa, se quisesse.
Sim, ele tinha laços na nova terra. Mas seriam laços tão frágeis que não aguentariam a distância? Porventura ele deixou de amar o que ficara em seu antigo lar? Ele o esqueceu mesmo distante?
Não, ele o guardou. Da mesma forma seria agora. As pessoas o guardariam em seus corações, mas permitiriam que partisse. Ele precisava entender que sempre estaria entre nós e que sabíamos que ele voltaria para nos buscar, se pudesse.
Quando lhe ofereci a resposta que procurou durante tantos anos, ele não teve reação. Absorveu minhas palavras, pensou e finalmente disse:
- É hora de ir. Preciso salvar mais uma vida.
- Qual? – perguntei desanimada, acreditando que ele nunca entenderia.
- A minha.
- Eu estarei aqui. – acrescentei rapidamente.
- Eu sei e estará aqui. – ele disse apontando para o seu coração, antes de finalmente partir em direção à sua casa.